Predador: Assassino de Assassinos chegou carregando não só o peso de décadas de
franquia, mas também as expectativas infladas após o sucesso de Prey (2022). E o mais
surpreendente é que, ao invés de simplesmente repetir a fórmula ou buscar a segurança da
nostalgia, Dan Trachtenberg escolheu o caminho mais arriscado e ousado: mergulhar de
cabeça na animação adulta e antológica. O resultado é uma obra que não apenas respeita
a essência dos caçadores Yautja, mas também a reinventa em camadas, estética e
intensidade emocional.
O filme se estrutura como uma antologia de três capítulos distintos em tempo e espaço,
mas que, sabiamente, dialogam entre si por meio de um conceito maior — o código de
honra dos Predadores e a busca humana pela sobrevivência diante da barbárie. Seja com a
guerreira viking Ursa, o ninja exilado Kenji ou o piloto latino Torres, Trachtenberg constroi
personagens sólidos e tridimensionais, que possuem arcos próprios, dilemas familiares e,
principalmente, algo a perder. Isso faz com que, quando o alienígena surge, ele não roube o
protagonismo da trama, mas potencialize seu drama e violência.
Visualmente, Assassino de Assassinos é um deslumbre. Criado integralmente no Unreal
Engine, o filme impressiona não apenas pelo realismo das texturas e cenários, mas pela
forma como mistura 3D e efeitos 2D em momentos específicos. As cenas de ação ganham
fluidez e brutalidade com a variação de framerate e detalhes manuais, evocando o que
vimos em animações como Aranhaverso e Arcane, mas com uma identidade própria, mais
crua e menos estilizada. Confesso que, em alguns momentos, a técnica aquarelada desfoca
um pouco demais para o meu gosto, suavizando o que deveria ser uma carnificina gráfica.
Ainda assim, o impacto visual é incontestável.
Outro ponto que me chamou atenção é a maneira como o roteiro de Micho Robert Rutare
equilibra o espetáculo sci-fi com temas mais profundos. Assim como Prey, esse longa
investe em explorar a cultura, os traumas e os códigos de seus personagens humanos
antes mesmo da ameaça alienígena aparecer. O capítulo ambientado no Japão feudal, por
exemplo, consegue ser quase todo mudo, mas transborda tensão e beleza visual. Já a
história de Torres, ambientada na Segunda Guerra, entrega o personagem mais carismático
e a sequência final mais emocionalmente satisfatória de toda a franquia desde 1987.
Ainda que cada capítulo tenha seu ritmo e preferência pessoal do público, é inegável que
Assassino de Assassinos avança as possibilidades narrativas e estéticas da saga. Os três
Predadores apresentados são únicos em visual, tática e armamento, o que mostra o
cuidado da direção em expandir o universo sem trair suas raízes. Há easter eggs, acenos a
fãs veteranos e até provocações para futuras continuações — e é aí que fica claro: a
franquia Predador finalmente encontrou quem entende o que ela pode ser.
Predador: Assassino de Assassinos não é só mais um filme da série, é uma declaração de
amor à franquia e uma prova de que animação adulta pode (e deve) ser usada para contar
histórias grandiosas, brutais e complexas. Com esse projeto, Dan Trachtenberg e Joshua
Wassung não só consolidam a boa fase dos Yautja iniciada em Prey, como estabelecem um
novo parâmetro para o cinema de ficção científica animado. Que venha Predador:
Badlands, porque depois disso, não quero outro nome à frente desses monstros.