Paolo Sorrentino nos convida a embarcar em um de seus devaneios visuais e emocionais com Parthenope, um filme que se propõe a ser uma epopeia feminina e, ao mesmo tempo, uma carta de amor a Nápoles. Inspirado na mitologia e no simbolismo da cidade, o diretor constrói uma narrativa que oscila entre o real e o onírico, acompanhando a protagonista desde seu nascimento nas águas do Mediterrâneo até sua maturidade como acadêmica. Entre essas duas pontas da vida, Parthenope (interpretada por Celeste Dalla Porta na juventude e Stefania Sandrelli na velhice) atravessa décadas envolta em uma aura de desejo e contemplação, cercada por homens fascinados por sua presença e por um cenário que se transforma com o tempo, mas nunca perde seu encanto.
Desde o início, Sorrentino estabelece uma forte relação entre Parthenope e o ambiente que a molda. Criada em uma família rica e despreocupada, ela cresce à beira-mar, sempre sob olhares admirados e muitas vezes lascivos. Sua beleza se torna um elemento tão central quanto sua inteligência, e é exatamente esse jogo entre fascínio e introspecção que conduz sua jornada. Em meio às festividades da alta sociedade napolitana e aos romances efêmeros, a protagonista se depara com figuras marcantes, como o escritor John Cheever (Gary Oldman), que entre tragos de álcool e conversas melancólicas, reflete sobre a transitoriedade do sucesso e do desejo.
A estética é um dos pontos altos do cinema de Sorrentino. A colaboração com a diretora de fotografia Daria D’Antonio se revela uma decisão acertada, proporcionando cenas que evocam pinturas renascentistas e fotografias nostálgicas de verões inesquecíveis. O ritmo da narrativa é deliberadamente contemplativo, quase passivo, como se o filme desejasse que o espectador se perdesse na mesma névoa de sensações que envolve Parthenope. No entanto, essa escolha pode não agradar a todos, pois em alguns momentos a história parece se render à estética em detrimento do aprofundamento emocional.
A protagonista, por sua vez, é uma presença enigmática. Seu magnetismo é inegável, mas sua interioridade permanece envolta em mistério, como se estivesse sempre à beira de revelar algo essencial sobre si mesma, mas sem nunca realmente fazê-lo. A própria abordagem da narrativa reforça esse aspecto, deixando muito nas entrelinhas e exigindo do espectador uma participação ativa na construção do significado da obra. Parthenope, como o próprio cinema de Sorrentino, é uma experiência sensorial, mas também uma provocação: o que realmente define uma vida? Beleza, inteligência, desejo, ou a soma de todas essas forças em uma dança sutil com o tempo?
O tempo é um tema central na obra, assim como o desejo, seja ele pela vida, pelo outro ou pela própria juventude perdida. O diretor reconhece que sua protagonista reflete não apenas um ideal feminino, mas também sua própria visão de mundo – um cineasta que, assim como Parthenope, busca encantar e seduzir seu público com imagens e histórias que os façam sentir.
O filme se encerra de forma otimista, com Parthenope já idosa sendo surpreendida por uma celebração nas ruas de Nápoles. É um momento que sintetiza a mensagem de Sorrentino: por mais que o tempo passe e a vida nos transforme, a capacidade de se maravilhar nunca nos abandona completamente. Parthenope pode não ser um filme fácil ou convencional, mas é uma obra que pulsa com o lirismo e a grandiosidade que definem o cinema do diretor. Como uma sirene moderna, a protagonista nos atrai com sua beleza e mistério, e cabe a cada espectador decidir se deseja sucumbir ao seu chamado ou apenas observá-la de longe, como Odysseus amarrado ao mastro de seu navio.