10 anos após seu excelente predecessor, “A Morte do Demônio: A Ascensão” promete repetir assinaturas da franquia – com muito horror corporal – e até resgata uma gota do humor sombrio – ausente no filme de 2013 – da trilogia de Sam Raimi.
Nossos protagonistas da vez são uma família. Após descobrir uma gravidez inesperada, tia Beth (Lily Sullivan) visita sua irmã Ellie (Alyssa Sutherland), mãe dos adolescentes Bridget (Gabrielle Echols), Danny (Morgan Davies) e de uma garotinha, Kassie (Nell Fisher), em busca de conselhos. A relação deles é mostrada sob uma luz positiva. Não existem aqui os clichês de adolescentes rebeldes e desobedientes. Existe um laço verdadeiro. São bons protagonistas, pois o público não tem motivos para querer vê-los sofrer.
O tema da maternidade é interessante pela dinâmica de histórias de possessão serem sempre sobre eliminar uma entidade que habita dentro do hospedeiro. Porém, o filme não usa o feto como objeto de desejo dos demônios mais do que usa ele como tortura psicológica para Beth, o que é melhor do que tornar essa uma história sobre a decisão do aborto – tópico controverso e divisivo. É clássico que demônios saibam dos conflitos internos de suas vítimas e aqui não é diferente. Além de estar grávida, Beth precisa salvar seus sobrinhos de sua irmã possuída, o que funciona como um curso intensivo de maternidade.
O cenário é uma novidade bem-vinda, tirando a história do isolamento na floresta para o aprisionamento urbano. O prédio onde tudo acontece foi condenado, então os moradores devem recolher seus pertences e se mudarem, o que reduz a população atual para poucos apartamentos ocupados. Através de Easter eggs é demonstrada inspiração no filme Alien – do qual sou imenso fã – para trazer a sensação de que não há escapatória. O andar é alto demais para se pensar em fuga pela janela, o perigo ronda os corredores e a chuva torrencial impede que gritos de socorro sejam ouvidos pela noite. Há uma expansão legal da mitologia. Estamos com uma versão diferente do Necronomicon que vimos anteriormente, o que deu liberdade à equipe de design de inovar a aparência do Livro dos Mortos usado nessa história. Além disso, temos rituais de possessão diferentes, o que justifica novos métodos de mutilação.
A combinação de maquiagem, efeitos práticos e efeitos digitais é alto nível. Feridas realistas são assinatura desde o filme anterior. Nada aqui passa como mal feito. Porém, dá medo? Subjetivo, eu sei. Existe um foco grande na movimentação dos possuídos, tipicamente contorcionistas, que não serve muito um propósito e acaba em alguns momentos se tornando mais uma obrigação a ser cumprida do que algo a se temer. Pra mim, faltou algo. Talvez tenha sido o trailer altamente expositivo que revela momentos chave. Recomendo se afastar dele. A adição de humor também não foi de bom tom pois este filme não se define como uma comédia de terror como os filmes dirigidos por Sam Raimi e o único momento em que temos a piada parece forçado para agradar fãs da trilogia clássica e atrapalha o ritmo da história sendo contada.
Tudo que se vê na tela é feito com esmero, porém nem tudo tem o efeito desejado. Talvez seja tão bem feito que ultrapasse a linha do bizarro e acabe sendo esteticamente agradável. Um uso melhor dos efeitos sonoros poderia ter sido feito – me lembro do primeiro usar deles para causar uma overdose sensorial em conjunto do que estava acontecendo em tela. Continuações têm o destino inevitável de serem comparadas aos seus antecessores e isso significa começar a partir de uma expectativa que dessa vez ofuscou o filme.