O multiartista carioca Igor Doval convida o Homem-Aranha a habitar as ruas do subúrbio carioca, trazendo o herói, associado à defesa dos mais vulneráveis, para os cenários conflitantes de um Rio de Janeiro soturno e sombrio. O filme de ação experimental “Aranha: Sob a Sombra da Máscara”, com o qual Doval venceu o prêmio de Melhor Diretor de Curta-Metragem no Cannes World Film Festival, agora tem sua trilha sonora disponibilizada em todas as principais plataformas de streaming, complementando o universo do filme premiado.
Os temas instrumentais e incidentais dão forma a pontos chave do filme, que tem duração total de 22 minutos. A trilha, com 15 minutos e 10 músicas, é um mapa do desenvolvimento da história de Pedro Parques, um Peter Parker às avessas que tenta conviver com a culpa após um incidente nas ruas do Rio de Janeiro. Faixas como “Apresentando o herói”, “Poder e responsabilidade” e “Tudo ou Nada” entregam parte da escalada de tensão ao longo do curta.
Doval é rapper, diretor e editor audiovisual, com trabalhos conceituados em TV, longas e curtas-metragens, publicidade e clipes. Ele assinou vídeos de grandes artistas de sua região, como Xamã, NaBrisa e Riko Viana. Há mais de 15 anos na área, já foi editor da TV Globo. Como ator fez participações em séries da Globoplay, Disney +, Amazon e Record. Agora, o projeto que une seu universo ao do Aranha é mais um capítulo onde Doval mostra sua versatilidade criativa.
A relação do artista com o aracnídeo coincide com a de outros tantos da sua geração: uma combinação de crescer lendo quadrinhos com o fascínio causado pelos filmes de Sam Raimi, no início dos anos 2000, oferecendo novas e modernas possibilidades visuais para o herói. Mas aqui, Peter é outro. Pedro é um super-herói negro que, além de lutar em prol dos que necessitam, também enfrenta problemas cotidianos que perseguem brasileiros diariamente. Uma disputa externa e interna, familiar e individual.
“A ideia surgiu do gosto que eu tinha pelo personagem do Homem Aranha. Um herói fora dos padrões, um herói com defeitos, um herói que apesar das dificuldades não mede esforços para ajudar e fazer o bem. Sendo um amante dos quadrinhos desde moleque e vendo todos os outros filmes já feitos, eu pensei: ‘Por que não fazer minha própria versão?’. E com isso surgiu aquela curiosidade, de imaginar como seria uma versão do aracnídeo no Rio de Janeiro, com nossa arquitetura, com nossos problemas, com nossa cultura”, recorda Doval.
A partir daí, ele começou a desenvolver a história piloto dentro do contexto carioca, já que a possibilidade de trabalhar diferentes versões para um mesmo personagem é amplamente explorada através dos multiversos. Doval se juntou, então, a Raphael Lion, co-criador da história e ator, para amadurecer a ideia e começar a colocar o projeto nos trilhos. Ele também foi o responsável por trazer o ator Will Crispim para viver o personagem principal, dando uma identidade única ao curta. Um Aranha negro, no Rio de Janeiro, com problemas reais.
“Aranha: Sob a Sombra da Máscara” vem na esteira de outros fan films, tão comuns no mundo nerd e geek. Doval se apropriou da porta aberta por outras adaptações cinematográficas para trazer sua bagagem de filmes feitos por fãs nos universos de Star Wars, Batman, Mortal Kombat e do próprio Homem Aranha. A liberdade criativa e o alto padrão de qualidade dessas produções serviu de inspiração para o projeto.
Mas o principal ponto era trazer um olhar local, suburbano e periférico para um herói que não é estranho a viver às margens. Sob esse prisma, Doval incorporou sua experiência como um criador audiovisual, desde desafios da compra dos equipamentos ao acesso a cursos profissionalizantes.
“Todos esses fatores dificultam e desanimam futuros cineastas, principalmente se você não tiver um bom background financeiro para cobrir sua inserção na área. Além de ser difícil aprender e começar, falando de um aspecto individual, também é muito difícil juntar uma equipe profissional para co-produzir os filmes, já que toda essa dificuldade não colabora para o desenvolvimento de uma cultura de produção de cinema nos arredores. Isso me levou a ter que aprender técnicas diversas nas mais diferentes áreas da produção, desde a escrita de roteiros, passando pela fotografia, som, até a edição final com efeitos especiais”, reflete o diretor.
Toda essa dedicação começa a render frutos. Além de colaborar com grandes nomes da música, Doval recebeu um dos maiores reconhecimentos da área: o prêmio de Melhor Diretor no Cannes World Film Festival, na França.
“Receber esse prêmio é sentir que, no final das contas, o esforço pelo seu trabalho foi recompensado e reconhecido. Saber que a gente estava competindo contra países que têm tradição no cinema como Estados Unidos e Inglaterra, ser avaliado por profissionais de Hollywood, e ganhar, é muito gratificante como artista. Devo muito à nossa equipe que estava junto desde o começo, que somou forças para fazer o projeto acontecer”, reconhece Doval.
Agora, o filme segue sua jornada pelo circuito de festivais antes de ser disponibilizado ao público. Enquanto isso, é possível conhecer a trilha sonora original em todas as principais plataformas de streaming.