Com uma premissa que mistura thriller político, ficção científica apocalíptica e um mistério clássico de assassinato, Paradise se estabelece como uma das séries mais ambiciosas da atualidade. Criada por Dan Fogelman, conhecido pelo drama sentimental This Is Us, a série se desenrola de maneira fragmentada e não-linear, explorando conspirações governamentais, o poder da elite bilionária e as consequências psicológicas de um evento catastrófico global. A trama começa com o assassinato do presidente Cal Bradford (James Marsden), um político carismático e controverso, sob os olhos atentos do agente do Serviço Secreto Xavier Collins (Sterling K. Brown). O mistério da morte de Bradford é o estopim para uma narrativa que logo revela um universo maior e mais sombrio: a cidade de Paradise, um refúgio subterrâneo para a elite e um seleto grupo de sobreviventes.
Se no início Paradise parece um thriller político convencional, logo se torna algo bem diferente. A revelação de que a cidade idílica é, na verdade, um bunker de luxo escondido sob uma montanha no Colorado transforma a narrativa em um estudo sobre poder, manipulação e sobrevivência. A presença da bilionária Samantha “Sinatra” Redmond (Julianne Nicholson), uma magnata que controla os destinos de todos ali, reforça a ideia de que a verdadeira governança não pertence a políticos eleitos, mas sim a um seleto grupo de ultra-ricos que moldam o mundo conforme seus interesses. A série acerta ao abordar essa dinâmica de maneira sutil, mas impactante, evocando um senso de desconforto sobre a influência crescente dos magnatas da tecnologia na política contemporânea.
O mistério do assassinato de Bradford, no entanto, acaba sendo um dos pontos menos interessantes da série. A revelação de que o assassino é Trent, um bibliotecário aparentemente inofensivo, perde impacto justamente pela falta de desenvolvimento desse personagem ao longo da temporada. Sua motivação – uma vingança pessoal decorrente da exposição a produtos químicos tóxicos durante a construção do bunker – soa menos relevante diante da escala dos eventos e do clima de paranoia que a série constrói tão bem. Ainda que a decisão de esconder o assassino à vista do público seja uma jogada clássica do gênero, o impacto emocional dessa revelação se dilui pela ausência de uma conexão mais profunda entre Trent e os protagonistas.
O que realmente faz Paradise se destacar é sua abordagem sobre luto e trauma coletivo. Xavier, viúvo e pai de dois filhos, carrega uma dor que vai além da perda de sua esposa, refletindo o desespero de toda uma sociedade tentando encontrar sentido após o colapso do mundo exterior. A sétima edição da série, que remonta ao dia do apocalipse e a responsabilidade de Bradford na tragédia, é o ponto alto emocional e narrativo da temporada. Essa sequência visceral destaca não apenas a catástrofe em si, mas também a frieza com que a elite selecionou os sobreviventes, reforçando o comentário social subjacente da série. Mesmo as tramas secundárias, como a da psicoterapeuta Gabriela Torabi (Sarah Shahi) e suas sessões quase experimentais, adicionam uma camada de profundidade ao mundo claustrofóbico de Paradise.
Paradise não é apenas uma série sobre conspirações e reviravoltas – é uma reflexão sobre o papel dos mais poderosos em tempos de crise e a fragilidade da humanidade diante do colapso. A série tem seus tropeços, especialmente na resolução do mistério central e no excesso de subtramas que desviam o foco da narrativa principal. Ainda assim, a performance magnética de Sterling K. Brown e a coragem de Fogelman em explorar temas ambiciosos fazem de Paradise um drama envolvente e relevante. Com uma segunda temporada já confirmada e muitas perguntas deixadas sem resposta, resta saber se a série conseguirá manter o ritmo e aprofundar as questões que apenas arranhou nesta primeira fase. Se conseguir, tem tudo para se tornar uma das ficções mais provocativas dos últimos anos.