Pasárgada, estreia da atriz Dira Paes na direção, explora as relações da protagonista Irene (Paes), uma ornitóloga, com família, sociedade e natureza. Ela está reclusa em uma casa no campo em busca de uma ave raríssima que não é avistada há um século.
Irene é retratada de início como uma pessoa mais confortável sozinha do que acompanhada. Suas interações com locais começam curtas e grossas. Sua conversa com sua irmã e seu chefe – um traficante de animais silvestres – se dão somente com suas versões artificiais, através da tela de seu computador, filtradas pela tecnologia. Em contraste, suas interações com a natureza ao redor são longas e terapêuticas, em contato direto com todos os seus sentidos, sempre cercada do canto das aves que lá habitam. Destaco aqui tanto a captação de som no local quanto o desenho de som feito na pós-produção. Somados ao som surround, assisti-lo no cinema se torna imersivo e faz a audiência empatizar com Irene.
Ao longo da história, Irene ganha um companheiro inesperado: o mateiro Manuel (Humberto Carrão). Ele serve de guia para ela conseguir acessar áreas da mata fechada onde se concentram as aves. Sua relação profissional e fria evolui para o desejo carnal à medida que ele demonstra sua comunhão com a natureza, algo que Irene deseja profundamente. Isso também alimenta a culpa que sente pelo objetivo de sua pesquisa: o tráfico internacional dessas aves. Ela ouve histórias de Manuel e compartilha com ele o fascínio por esses animais, mas sabe que uma vez que conseguir encontra-los, roubará dele a chance de revê-los.
O título é referência ao poema de Manuel Bandeira, “Vou-me embora pra Pasárgada”, que fala do desejo de ir para um lugar longe da tristeza, cercado de natureza, entorpecentes e libertinagem. Irene compartilha dessas vontades, mas aprende que nem sempre se pode ter tudo o que se quer. Dira Paes se prova uma diretora competente, sem medo de contar sua história num ritmo contemplativo, sem pressa, e demonstra domínio da linguagem do cinema, com uma fotografia que procura mostrar mais que contar.