“Um conto de ambições exageradas e excessos escandalosos, ele traça a ascensão e queda de múltiplos personagens durante uma era de desenfreada decadência e depravação no início de Hollywood.”
Não é à toa que a década pós-Primeira Guerra Mundial foi apelidada de “Loucos Anos 20” e isso fica claro na chocante abertura de “Babilônia”. O filme abre com o transporte de um animal exótico. Nesta curta cena a maior parte do tom do filme é definido, cada revelação programada meticulosamente. Primeiro a revelação de qual animal e toda a curiosidade em volta disso. Depois o próprio transporte é mostrado e aqui o diretor Damien Chazelle (“La La Land”; “Whiplash”) estabelece até onde ele está determinado a ir para ilustrar a loucura da década. Por último, a revelação de seu destino absurdo. A partir dali qualquer coisa vale e mesmo assim nenhum acontecimento perde seu impacto.
A “Era do Jazz”, como também ficou conhecida, foi palco de mudanças culturais na sociedade norte-americana. Mulheres ganharam direito ao voto (apesar disso, infelizmente, se aplicar basicamente às mulheres brancas); havia um senso geral de quebrar com tradições e abraçar novas tecnologias, como carros e cinema. Música e dança eram mais provocativas; a “Lei Seca” estava em vigor e criminalizava o consumo de álcool. Foi também a época em que o estilo de vida “melindrosa” surgiu, no qual mulheres usavam roupas mais reveladoras, tinham independência financeira e tratavam o sexo de maneira casual. Festas regadas a drogas e álcool eram a imagem da sociedade cosmopolita e o que jovens de cidades pequenas e conservadoras buscavam. Este contexto é importante para entender melhor os personagens do longa.

Além de sua metalinguagem implícita, afinal é um filme sobre os bastidores do início dos filmes falados, há a inspiração em momentos ficcionais que viralizaram na forma de “memes”. Quando Brad Pitt é introduzido falando italiano, ele ao mesmo tempo caracteriza o personagem como alguém que quer parecer intelectual e faz referência ao personagem de Pitt em “Bastardos Inglórios” e sua hilária cena falando “buongiorno”. Existem outros momentos de pura referência ao cinema moderno, adicionando camadas à experiência, porém não há perda de sentido caso o espectador não os identifique.
Suas indicações ao Oscar em três categorias (melhor cabelo e maquiagem, melhor trilha sonora e melhor som) são completamente justificadas. O roteiro é esperto em apresentar novidades do cinema do final dos anos 20, como trilha sonora e diálogos falados, e usar disso das maneiras mais espetaculares até as mais grotescas. Um momento em particular foi de causar ânsia de vômito (inédito para mim) e todo o crédito vai para a edição de som. Dica para quem assistir: não é a cena inicial. Apesar de não ter sido agraciado com outras indicações, merecia algo nos quesitos fotografia e montagem. Seus planos sequência não estão lá só para impressionar pela dificuldade técnica (desmistificada desde o uso de cortes escondidos como em “Birdman” e “1917”), mas para aumentar a imersão dos ambientes caóticos de festas e dos sets de filmagem. Todas as cenas são cheias de vida. Quase sempre é possível observar outras histórias se desenrolando no plano de fundo, diferente de filmes em que extras estão lá só para fazer volume.
Algo inesperado, porém completamente justificado na intenção do filme, foi o passeio dado por vários gêneros do cinema: comédia, drama, ação, aventura, suspense, terror, musical e um tiquinho de ficção científica. Além disso, numa jogada metalinguística meio “Inception”, a vida dos personagens imita a arte em certos momentos, com falas ora ditas em momentos de interpretação, ora em momentos da vida “real” dos personagens, simbolizando como a vida em Hollywood nessa época podia parecer com estar em um filme. É realmente uma ode ao cinema como um todo e toca os corações dos amantes da Sétima Arte, como fica bem claro nos seus momentos finais à la viagem do astronauta Dave pelas barreiras do tempo e espaço em “2001: Uma Odisséia no Espaço”.

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