Escrito por Rebecca Lenkiewicz e dirigido por Maria Schrader, esse filme mostra o esforço coletivo de jornalistas para trazer à tona escândalos de assédio sexual na indústria cinematográfica
Inspirado em casos reais que aconteceram recentemente, a história acompanha duas jornalistas (interpretadas por Carey Mulligan e Zoe Kazan) em sua jornada para convencer as vítimas a darem seus depoimentos e, assim, expor os agressores. Entretanto, esse processo não é de maneira alguma simples, uma vez que se evidencia ao decorrer do filme a existência de uma organização sistêmica no intuito de ocultar esses casos e silenciar as mulheres. Em virtude disso, acompanhamos a demorada investigação que, invariavelmente, exerce influência no andamento da narrativa e aparenta, por certas vezes, não ter fim.
É justificável, por sua vez, a história ser mais lenta pois reflete o árduo processo de enfrentar um sistema consolidado, talvez por causa disso eu e mais alguns estejamos dispostos a relevar essa característica que poderia, em outras circunstâncias, ser considerada um empecilho. Sob essa ótica, a essência narrativa mais uma vez eclipsa os eventuais problemas da obra por abordar justamente a temática do silenciamento. Em síntese, conclui-se que é imprescindível levar esses acontecimentos ao imaginário coletivo porque é necessário discutir o assédio para que seja possível, dessa forma, combatê-lo.
Sobre o filme em si, acredito que é pertinente mencionar a – esperada – contribuição feminina em sua realização, eu particularmente não me lembro de ver um projeto audiovisual com uma diretora (Maria Schrader), escritora (Rebecca Lenkiewicz) e diretora de fotografia (Natasha Braier) mulheres, mas isso pode ser uma insipiência de repertório da minha parte. Além disso, a utilização de áudios reais da investigação é interessantíssima por alguns motivos, não somente por dar um quê de realismo à obra, mas também por evocar a presença simbólica dos abusadores, sem contar a ironia da voz deles (agressores) se fazer presente enquanto a delas (agredidas) tende a ser, novamente, silenciada.
O silêncio ensurdecedor que orbita essa doença sistêmica pautada em uma relação assimétrica de poder e o subsequente descrédito da vítima – em muitas ocasiões, por parte dos próprios veículos midiáticos – é isso que esse filme se propõe a discutir, os pilares da problématica que permanecem ocultos, o senso de impunidade dos poderosos, a indiferença da maioria e, acima de tudo, o trabalhoso processo de organização para enfrentar um sistema desigual. Uma história que precisa ser contada, sobre um tema que precisa ser debatido, espero que tanto os homens quantos as mulheres ouçam o que ela tem a dizer.