Longa-metragem do cineasta italiano Luca Guadanino, baseado no romance homônimo de Camille DeAngelis, acompanha a trajetória de dois jovens unidos por um ímpeto tanto controverso quanto incontrolável.
Na história, ambientada décadas atrás, uma jovem canibal (Taylor Russel) decide buscar o paradeiro de sua mãe após ser abandonada por seu pai devido à sua condição. Durante esse processo, ela aprende a reconhecer os seus iguais e chega a encontrar alguns, mas o único com quem realmente se identifica é outro jovem (Timotheé Chalamet). Então, um intenso romance nasce dessa união entre duas pessoas repletas de problema pessoais.
Essencial ressaltar a palavra “condição”, uma vez que o canibalismo aqui não é abordado como uma mera escolha de alguém desprovido de empatia, ao menos não sob a perspectiva da protagonista, mas sim como uma força inexplicável e parcialmente incontrolável. Tal cenário, assemelha-se ao naturalismo literário, que retratou a animalização do ser humano ante o determinismo, segundo o qual o ambiente, a hereditariedade e as condições em que os indivíduos estão inseridos norteiam suas atitudes e seus padrões comportamentais. Assim, a antropofagia pode ser facilmente vista como uma metáfora para a tentação e subsequente contenção dos indivíduos perante seus desejos.
Resumir a experiência de assistir a esse filme não aparenta ser a mais árdua das tarefas: Intensa, inquietante e indigesta. Há um quê de ternura, no entanto, e talvez esse seja o maior dos méritos da direção de Luca Guadanino – laureada com o Leão de Prata no Festival de Veneza – que nos faz empatizarmos com a dupla de protagonistas apesar de suas condutas. Mas, reitero, não é para todos os gostos, os entusiastas dos filmes de terror podem encontrar aqui algo muito dramático e profundo e os interessados em dramas e romances podem se deparar com algo um tanto perturbador. Creio, entretanto, que esse amálgama é bem feito e, principalmente, utilizado para criar uma obra singular.
Em última análise, gostaria de trazer à discussão o simbolismo das linhas que permeiam essa história: dos cabos das torres de transmissão no início à fita cassete que acompanha a protagonista – e é cortada ao encerramento de um ciclo de sua jornada – além das notas musicais intermitentes produzidas por uma única corda do violão da, aliás, espetacular trilha sonora. Sob essa perspectiva, uma lenda asiática defendia a existência de um fio vermelho que uniria as almas gêmeas. Seria bastante oportuno, assim, traçar um paralelo, mas acredito que essa não é a leitura mais adequada da obra. Em vez disso, predomina ao decorrer da narrativa a sensação de que tudo está por um fio e prestes a se romper.