A recente produtora, DailyWire+, do jornal The Daily Ware, lançou mais um filme em sua plataforma. Distribuída pela Synapse Distribution (no Brasil), Trancada conta com muitas mensagens religiosas e questões sociais.
Sinopse: Quando uma jovem mãe é trancafiada dentro de uma despensa por seu violento ex-namorado, ela deve usar sua astúcia para proteger seus dois filhos pequenos do perigo crescente enquanto encontra uma fuga.
Dirigido por D.J Caruso, “Trancada” engloba elementos de seus sucessos passados, Paranoia (2007) – nossa, estou velho! – e Eu Sou o Número Quatro (2011). Diferente das anteriores, o recente filme do diretor não possui aspectos de blockbuster (grande orçamento envolvendo o projeto), mas creio ter sido algo bom no escopo geral.
Como dito antes, a DailyWire+ acabou de iniciar sua empreitada. No início deste ano foi investido, aproximadamente, 100 milhões em produções de filmes. Esse dinheiro de pinga é perfeito para usar criatividade e focar no importante: uma boa história. Ou pelo menos deveria ser assim… vamos recapitular: filme de baixo orçamento com a maior parte dele se passando no mesmo cenário. Em um breve retrospecto, podemos citar obras muito boas na mesma temática como Janela Indiscreta (1954), Enterrado Vivo (2010), O Quarto do Pânico (2002), A Conspiração (2012) e por aí vai.
Todos os mencionados possuem a imprevisibilidade como modus operandi, mantendo o espectador envolvido na trama apesar da claustrofobia. Pois bem, e “Trancada”? Bom, ela é “ok“. A protagonista possui uma preocupação externa para deixar a situação mais desesperadora. Então temos uma mulher presa em um ambiente e seus filhos pequenos sem os cuidados de um adulto. Embora pareça uma boa corrida contra o tempo, o próprio filme não se preocupa em manter essa problemática como importante, infelizmente.
Para contextualizar, uma das crianças deve ter em torno de quatro a seis anos e o outro um ano, já que é difícil para a mesma se manter sentada. Em determinado momento você realiza questionamentos óbvios, “como diabos elas estão se mantendo? O que estão comendo? Como estão se virando naquele frio extremo?”. Para ser justo, a filha mais velha consegue se comunicar com a mãe e realizar instruções básicas, mas mesmo assim, você não imagina uma criança tão pequena conseguindo executar certar façanhas como a personagem consegue.
Por falar nisso, falemos dos atores. O longa é estrelado por Rainey Qualley (Oito Mulheres e Um Segredo, 2018), intérprete de Jessica, e facilmente a melhor coisa do filme; entrega muito bem toda essa carga de uma mãe com um passado trágico tentando ser melhor em prol dos seus filhos. A filha mais velha, Lainey foi interpretada por Penelope Martone e o mais novo, Mason, interpretado por Aidan Steimer. Temos também Jake Horowitz como Rob, pai das crianças, e Vincent Gallo como Sammy.
Deixei para abordar os atores apenas agora, pois tenho uma observação. Comparar atuações nesse filme é injusto. Rainey possui muito mais tempo de tela aos outros. Resta então dizer se ela conseguiu segura o filme sozinha ou não. A resposta é não. Todavia, não é por culpa da atriz. Lembra do filme precisar criar situações criativas para manter o público entretido em produções com essa temática? Então, eles não conseguiram. Se não fosse pelo perigo real do último ato, seria apenas mais um filme de redescobrimento. A premissa é boa, a entrega é morna, e sobre isso Rainey nada podia ter feito.
Outro ponto importante nessa história é a religião. Jessica aparenta ser ateia e isso é constantemente confrontado à medida que o filme se desenvolve. A personagem é quebrada internamente, o momento é desafiador e quanto mais tempo ela passa enclausurada, mais perigo seus filhos correrão. Realmente nos apegamos à fé em momentos de desespero, seja ela qual for. Dependendo da sua convicção isso pode incomodar, soar forçado.
Em questões técnicas o filme não é um primor, contudo, também não é medíocre. Apesar de ser apenas a terceira produção da empresa, a DailyWare+ está muito bem. Os efeitos sonoros são bons, a filmografia agrada, a colorimetria e trilha sonora é na medida, direção competente, roteiro… vamos deixar esse de lado. Como dito antes, não é ruim, só é mediano mesmo. Independente disso, esse roteiro foi muito bem falado entre o meio.
Escrito pela estreante Melanie Toast, “Trancada” foi destaque na 15ª premiação do The Blacklist 2019. Tal evento elege os melhores roteiros ainda não produzidos, votados por produtores de Hollywood e agências de talentos. Então, de fato, essa história tem alguma coisa atrativa nela, só não consegui sentir. Vai ver todo esse reconhecimento me animou além do oferecido pelo produto final. Teria eu caído nas garras da expectativa? Talvez. É uma hipótese.
“Eu estava animado para dirigir um filme ferozmente independente a partir de um roteiro brilhante de Melanie Toast, que se infiltrou no meu DNA criativo em 2019, quando o li pela primeira vez. Me foi dada a liberdade criativa de criar um filme apresentando um personagem falho, mas gracioso, que deve lutar contra o vício e circunstâncias terríveis para encontrar luz em um lugar muito escuro.”, comentou o diretor em uma entrevista para o Deadline.
Sendo bem sincero, não é o melhor filme do mundo, porém muito mais competente a grande maioria por aí. Entretanto, para entender essa obra melhor tenho de dar um pequeno adendo.
O The Daily Ware é um conglomerado de mídia conservadora e partilha visões de tradicionalismo, entre outras coisas, segundo a Wikipedia (USA). E acredite, isso explica muita coisa.
Trancada” já está disponível pelas plataformas Claro TV+, iTunes/Apple, Google/YouTube e Vivo Play.