Assistindo a nova película francesa da Netflix me deparei com um erro comercial. A produção foi vendida como terror, quando na verdade é um thriller dramático. Dito isto, esteja avisado caso se anime ao ver imagens promocionais e trailers.
Uma família com problemas financeiros passa a ter como renda principal a venda de farinha e proteínas, ambas fornecidas por gafanhotos. Após contato com sangue esses gafanhotos passam por uma mutação, alterando bruscamente o cotidiano dos envolvidos.
Além da possível crítica ecológica, o longa utiliza os gafanhotos assumindo que o telespectador saiba de toda destruição passível de ser causada pelo inseto; fora o claro prenúncio deles agirem como pragas indo de encontro às menções bíblia. Eles incomodam, dão estranheza e são visualmente desconfortantes, elementos esses passados com maestria ao telespectador. Pontos para o diretor, Just Philippot.
Importante ressaltar, quando o impacto vem, ele vem com força. Não são cenas para você se horrorizar ou temer. Estão ali no puro intuito de impactar. Neste quesito o longa se sai muito bem. Não será o filme mais chocante da sua vida, mas aqui é uma boa ideia de como impactar sem necessariamente ser algo nojento ou horroroso.
O núcleo familiar é muito bem estruturado. A mãe Virginie (Suliane Brahim), super batalhadora e faz o possível para garantir o sustento a todos. A irmã mais velha, Laura (Marie Narbonne), sofre bullying na escola pelo trabalho da mãe e, apesar de nitidamente incomodada com a situação, a ajuda sem muitos questionamentos. E, por fim, o caçula Gaston (Raphael Romand), um garoto bonzinho brincalhão.
É difícil ver divisões de personalidades tão bem estipuladas como nesse filme. Cada um contribui para momentos chaves de questionamentos, ações e conflitos, aprofundando a trama de forma bem gradativa. Afinal esse filme é mais voltado para o drama, apesar de outros gêneros impostos nele.
O desconforto vem acompanhado das motivações dos personagens. O não compartilhamento de acontecimentos ruins no intuito de poupar o próximo, aguentar sofrimentos em prol do bem estar de outrem; são coisas que ganham bastante força quando são adicionados elementos de thriller à obra.
Nem tudo são flores. O ritmo sofre de urgência. Há momentos bem longos de conversas, dando uma certa monotonia ao filme. Não é algo frequente e nem irá te distrair, mas quando acontece você anseia para cortarem e darem continuidade a trama principal. Sabemos o valor dessas cenas (diálogos) mais longos para construção de universo, mas, na real, você só quer ver a próxima cena.
Os momentos de thriller são legais, o drama não é exagerado, a problemática é ok, os atores não foram pagos com uma coxinha e um guaraná, tem cenas impactantes, personagens de fácil identificação e gafanhotos mutantes. Apesar da palavra “mutantes” o longa é bem pautado na realidade. Pode deixar que não existem insetos gigantes ou esquisitões aqui.
Este filme é devagar – não arrastado – e tem seu climax muito bem feito. No mar de produções da Netflix até que esse filme não é ruim, se for pensar direito.
A Nuvem encontra-se disponível no streaming da Netflix