Em 1940, o personagem Coringa era lançado na edição #1 de Batman, por Bob Kane e Bill Finger, como antagonista do Homem-Morcego. Talvez os criadores não imaginavam como o personagem iria crescer tanto a ponto de ser tornar quase tão grande ou até mesmo maior que o protagonista a ponto de finalmente, em 2019, ganhar seu próprio filme.
Não é de hoje que o Coringa rouba a cena nos filmes do Batman. Em 1989, no filme Batman de Tim Burton, o vilão, interpretado por Jack Nicholson, rouba a cena e é inclusive mais memorável que o protagonista interpretado por Michael Keaton. O mesmo se repetiu em 2008, em Batman: O Cavaleiro das Trevas, de Christopher Nolan, quando Heath Ledger ganhou o Oscar póstumo de Melhor Ator Coadjuvante por literalmente dar sua vida ao antagonista.
Agora, com o filme Coringa, de Todd Phillips, Joaquim Phoenix dá a vida a uma origem misteriosa do personagem, a qual ficou em aberto após o filme de 2008. É claro, sem relação com quaisquer universos cinemáticos do morcego, iniciando aqui talvez um próprio, mas podemos presumir que o filme se passa, teoricamente, 20 anos antes de Batman: O Cavaleiro das Trevas se fizermos um esforço para tentar encaixar, pois é lógico que a versão interpretada por Heath Ledger é a que mais se aproxima da nova, dando ao personagem uma visão muito mais realista, inspirada na criada por Christopher Nolan, em que as cores do palhaço são graças a maquiagem e não ácido, além de dar um passado levemente inspirado na visão de Alan Moore, em Batman: A Piada Mortal, onde o palhaço tentava a carreira de comediante antes de toda sua tragédia. E por falar em Alan Moore, temos aqui neste filme uma construção muito parecida com V de Vingança, onde vemos em três atos um caso de depressão que leva a luta de classes e revolução – existe uma sequência que é exatamente como em V de Vingança, quando a população realiza um motim usando a máscara do palhaço. Podemos presumir que, a máscara do palhaço será o novo símbolo dos revolucionários daqui pra frente.
O filme foge do tom blockbuster comumente usado nos filmes inspirados em personagens de quadrinhos. Aqui, com a produção de Martin Scorsese, vemos uma fotografia que lembra muito a de Taxi Driver, inclusive com participação especial de Robert De Niro. Particularmente, ouso dizer que gosto muito mais de quando a Warner Bros. Pictures junto com a DC Filmes vai muito mais para este lado cult. É claro, esta parceria já foi premiada muitas vezes, enquanto tentativas recentes de buscar mais cores e humor, como foi realizado nos fracassados em crítica Lanterna Verde e Esquadrão Suicida, falharam, o que leva a concluir que é muito melhor para a DC Filmes voltar ao tom artístico, menos popular, pois funciona, e aqui funciona muito bem. Este é um filme para concorrer a Oscar em todas as categorias que não em Efeitos Visuais.
Porém, temo que o filme é perigoso. É necessário estar muito bem psicologicamente, pois a trama é demasiada envolvente, recheada de gatilhos que podem perturbar a mente de um depressivo ou de qualquer um com pé na revolução armada – o filme também entra em quase todas as discussões da Era Trump, como a principal, do porte de armas. Mesmo assim, a trama serve mais de alerta e crítica do que de incentivo, eu pelo menos creio, como a discussão recente que vemos sobre a hipocrisia do Setembro Amarelo, satirizando em seus próprios diálogos que as pessoas com problemas psicológicos tem apoio da boca pra fora, mas na verdade são tratadas como lixo, tal como viramos nossos olhos para os mais pobres, numa fórmula bem semelhante a de Clube da Luta, porém, com um terceiro ato um pouco mais no princípio da Revolução Francesa com a revolta da população contra os mais ricos – podemos concluir daqui também que o Batman, tal como o Coringa, é fruto dessa desigualdade social e descaso do governo.
É difícil eu apostar que um filme inspirado em quadrinhos concorra a Academia, mas neste eu posso sim apostar, e ao mesmo tempo, realizando o feito de mandar bem em bilheteria – relativamente, é claro, pois não é um filme em 3-D para bater um bilhão, mas é um excelente filme 2-D que pode ultrapassar meio bilhão se deixar.
Coringa chegou aos cinemas na quinta-feira dia 3 de outubro.
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