Olivia Wilde faz parte de um seleto grupo que acerta de primeira. Fora de Série, sua estreia na direção, é uma ode à amizade e uma representação real da adolescência. Molly (Beanie Feldstein) e Amy (Kaitlyn Dever) são duas garotas nerds que abdicaram da vida social para focar nos estudos até perceberem que deveriam aproveitar, pelo menos, o último dia antes da formatura e fazer tudo o que não fizeram durante o Ensino Médio. Com essa sinopse, é possível lembrar de vários filmes de comédia pastelão que abordam as “aventuras muito loucas de jovens que querem se divertir”, com Superbad ou Projeto X, mas o longa de Wilde prova seu diferencial a cada cena.
Para começar: diversidade! A princípio, lembrei da série Glee ao ver como os vários grupos são representados, porém, Fora de Série vai além. A escola onde as meninas estudam parece ser uma utopia estudantil. São alunos de todas as raças, sexos e tribos, banheiros sem definição de gênero, professores e diretores que confiam nos alunos, pessoas praticando seus hobbies no meio do pátio e sem bullying. Parece real? Sim e não. Por mais que seja difícil imaginar um ambiente tão harmônico, principalmente quando o relacionamos a adolescentes, essa escola parece tentar imaginar o que seria o ideal com as atuais mudanças na sociedade e consegue muito bem.
As questões que se passam nas cabeças dos jovens são tratadas com perfeição pela diretora e pelo roteiro. De início, há um ar brega no filme, mas de forma proposital, mostrando como tudo durante esse período de nossas vidas pode ser ridículo ou transformado em uma grande catástrofe em segundos. Não lembro de ter visto um projeto que tratasse da sexualidade como algo tão natural da vida humana, assim como pulei da cadeira quando percebi como o feminismo é pauta chave pra o roteiro. As personagens se questionam se estão sendo hipócritas em suas decisões relacionadas a outras mulheres, falam sobre pornografia e masturbação, quebram o velho estereótipo de rivalidade entre mulheres por causa de um personagem masculino e mencionam de forma habitual nomes importantes do movimento, como Time’s Up e a militante Malala Yousafzai. Todos os debates são extremamente atuais e, principalmente, verdadeiros. Ao mesmo tempo que elas são muito seguras de si em certos quesitos, possuem várias dúvidas sobre seus papeis em outros.
Como já deu para perceber, está difícil destacar apenas alguns recortes do filme, mas gostaria que todos prestassem atenção na montagem e na trilha sonora. A edição acompanha cada sentimento das personagens e traz ao espectador a experiência sensorial de tais emoções. Já a trilha ajuda essa montagem com eficiência, ampliando o significado das cenas e se aproveitando de possíveis referências prévias do espectador. Outra coisa que merece um olhar mais aprofundado são os atores. Todos eles. É raro adolescentes aparentarem serem adolescentes em filmes de Hollywood, então, encontrar bons atores, com a aparência das idades certas, que passam veracidade em todas as ações e expressões, é um deleite para os olhos. Até aqueles que poderiam parecer meros arquétipos, possuem suas devidas reviravoltas.
São poucas as coisas que me incomodaram no longa, a principal delas é uma sequência em stop-motion que, por mais inesperada que seja, não sei se encaixou bem com tudo o que já havia sido apresentado. Ah, e um aviso aos mais racionais: é preciso estar bem aberto ao absurdo para poder apreciar o longa. Embora o bom trabalho da direção consiga nos convencer de que tudo ali é possível, caso sua suspensão da descrença seja realmente muito baixa, talvez você prefira outro filme. Além disso, também há alguns clichês quase impossíveis de se esquivar: os pais sem noção, o aluno apaixonado pela professora, a maluca da turma… Porém, isso é tão pouco se levarmos em consideração todos os méritos do filme, que nos permitimos até a gostar desses “errinhos”.
Por fim, Olivia Wilde consegue provar como um humor inteligente, recheado de vergonhas alheias e até bem inclusivo, pode renovar uma fórmula ultrapassada da comédia. Fora de Série é, ou deveria ser, o futuro bem-sucedido de um gênero que, aparentemente, só melhora à medida que incorpora cada vez mais a realidade do mundo em sua essência.