Quem só conhece Jonah Hill de comédias como Superbad e Anjos da Lei provavelmente irá se surpreender com a estreia do ator no roteiro e na direção. Porém, quem já conferiu alguns de seus trabalhos mais “alternativos” conseguirá enxergar semelhanças nos traços de seu novo longa Anos 90. O filme acompanha Stevie (Sunny Suljic), um pré-adolescente que começa a andar com um novo grupo de amigos e se interessar por skate. Uma trama simples e, ainda assim, interessante.
A direção de Jonah Hill é extremamente perceptível e ele consegue nos levar de volta aos anos 90 de uma maneira natural, sem cair nas armadilhas dos clichês. A tela é fechada em 4:3 – lembra da TV de tubo? – e bem granulada, dando a impressão não apenas de que os personagens estão vivendo décadas atrás, como que o próprio filme foi produzido nessa época. Além disso, a montagem é fluida e conduz cada emoção que sentimos durante o longa, nos divertimos, ficamos com raiva ou temerosos assim como o protagonista, ou melhor, junto do protagonista. A trilha sonora é ideal por não escolher nenhuma música previsível. Sentimos a idade das canções mesmo quando não as conhecemos.
Enquanto a direção é bem precisa, o roteiro de Hill tenta abordar diversos assuntos de uma vez. Alguns com acertos e outros não. Em apenas 84 minutos, o longa trata de todo um mundo dos adolescentes e seus conflitos: a descoberta da sexualidade, a eterna necessidade de atenção, as festas regadas à drogas e álcool, a diferença entre a maturidade de homens e mulheres, a inveja material, o conflito com as figuras de repressão (como pais ou polícia). Esses e vários outros detalhes são pincelados aos poucos durante a trama e surgem de forma natural como fator condutor da história. Já parece bastante coisa, certo? Mas tem mais, no entanto, não com o mesmo êxito. Hill também tenta criar camadas para a família de Stevie, mas não consegue se aprofundar nem na mãe – tratada apenas como mais uma pessoa que não enxerga que seu filho está crescendo – nem com o irmão, um típico valentão que, ao ter a chance de se redimir, perde o foco da câmera. Talvez o único detalhe mencionado brevemente durante a trama, mas, mesmo assim, bem notável, tenha sido um diálogo sobre o abismo na diferença de perspectivas de vida entre negros e brancos. Foi rápido, porém, no cerne do assunto.
Apesar desses deslizes de roteiro, uma coisa consegue transformar Anos 90 em umas das melhores representatividades da época já vista no cinema: as atuações. Como todo bom filme em que “nada acontece”, a construção e o carisma dos personagens carregam o espectador pela história. Os adolescentes são perfeitos! Eles têm a idade certa; são de diferentes classes sociais, cores e etnias; conversam coisas bobas típicas da idade; em momentos têm inseguranças e em outros se acham invencíveis. Tudo neles é tão genuíno a ponto de me perguntar se não estavam improvisando durante quase todo o filme. Obviamente, o destaque na atuação desses meninos vai para o protagonista. Sunny Suljic é expressivo e nos convence com seu olhar desde a primeira cena: às vezes brilham por ele estar impressionado com o que está vivendo, mas também podem condenar e odiar como quando ele explode no carro após receber uma punição. Sem dúvida, Lucas Hedges e Katherine Waterston são os nomes mais famosos do elenco, mas seus personagens são prejudicados por um roteiro que lhes dá tão pouca atenção que nem se preocupa em nomear a mãe.
Em suma, Anos 90 peca por perder grandes oportunidades de engrandecimento de alguns personagens, mas é um filme intrigante de se assistir, não só pela nostalgia de uma década, como pelo recorte verdadeiro de uma importante fase na vida de qualquer pessoa.