Não tão bizarro quanto o padrão Del Toro, mas os fãs vão amar e outros também.
(Este artigo não contém spoilers – revelações climáticas de enredo)
Não é de hoje que o diretor Guillermo Del Toro – mais conhecido por O Labirinto do Fauno e Círculo de Fogo – gosta de explorar romance e aventura com monstros criados não-digitalmente – inclusive, outros diretores deveriam aprender muito com ele. Ele sabe como contar uma história envolvente e inclusive explorar todas as possibilidades que o cinema permite. Você não pode ser desatento assistindo a seus filmes, pois cada sequência traz elementos em cena que compõe o universo e o enredo.
Em A Forma da Água, temos uma pequena aula de como apresentar personagens sem tornar exaustivo. Conhecemos Eliza Esposito, – aliás, palmas para Sally Hawkins que conseguiu ultrapassar a barreira da linguagem e dar a vida a uma personagem que você acha tão encantadora, mesmo sem ouvir uma palavra – uma moça solitária e muda, que vive seu dia-a-dia costumeiro sem pestanejar. A personagem conhece tão bem sua vida que sabe quanto tempo leva tudo o que faz. Trabalha com faxina em um misterioso laboratório, onde conhecemos sua fiel colega Zelda, – Octavia Spencer, de Estrelas Além do Tempo – que ao contrário de Eliza, fala e bastante, nos apresentando completamente sua vida sem nem precisar mostrar e servindo de complemento para os diálogos com Eliza, assim contribuindo também como tradutora da protagonista. Zelda conhece tão bem Eliza e sua linguagem de sinais quanto Giles, – Richard Jenkins, de O Visitante – um velho pintor falido, vizinho de Eliza, cujo a moça cuida durante o dia.
O interessante é como cada personagem tem sua sidestory, que para o espectador pode não acrescentar a trama principal, mas contribui para suas ações ao clímax, junto também com os típicos objetos em cena como copos d’água, ovos, quadros, pratos, gelatina, relógios, entre outros que vão servir de utilidade climática numa história que conta bastante sobre o preconceito bem presente na sociedade americana durante a Guerra Fria – coisa, inclusive, que nem é tão bem demonstrada nos filmes históricos produzidos atualmente. E é a Guerra Fria que move a história, quando o misterioso chefe de segurança – entre aspas – Sr. Strickland – Michael Shannon, o General Zod de O Homem de Aço voltando a um ótimo papel de vilão – traz da Amazônia uma criatura cultuada pelos sul-americanos como um deus, a fim de passar a frente dos soviéticos na corrida espacial. A criatura, que torturada dia-a-dia, vê alívio nos poucos momentos em que tem com a faxineira Eliza, serve de companhia perfeita para a própria, que lhe ensina linguagem de sinais e cultura, levando o cientista Dr. Robert Hoffsteider – Michael Stuhlbarg, A Chegada – a perceber que a criatura é racional e não selvagem, mas que apenas não se comunicava como um humano, e o resto vocês já imaginam no que vai dar.
É claro que a composição de Del Toro com seu jogo de câmera, elementos em cena, construção de personagens, uso da música, fotografia, figurino e maquiagem são brilhantes, mas infelizmente o filme peca em apresenta um enredo tão repetido quanto qualquer filme de amor proibido e animações da Disney e não satisfeito, se preocupa em dar sinais para o final previsível, subestimando a inteligência do espectador. No fim, o filme não passa de um romance shakesperiano, que se disfarça de thriller científico com background histórico e político, mas que no final se torna um tremendo Deus Ex com soluções mágicas para um roteiro que desenvolvia uma complexidade que de nada serviu para a conclusão. É como se, estivéssemos vendo um remake de um filme que já vimos milhões de vezes, só que com a produção visual de Del Toro. Não me levem a mal, o filme é ótimo, mas me perdoem os fãs, eu não entendi o que fez concorrer a Melhor Filme a não ser pelo nome do diretor.
Mas assistam, terão uma experiência fofa e confortável – pode-se constranger por alguns momentos, mas sentindo-se na pele nos personagens envolventes, percebe que faria as mesmas ações.