Em ano que lançou grandes fortes séries de animação japonesa como Fire Force, Vinland Saga e Rising of the Shield Hero, uma cresceu o fandom aos poucos e se tornou a mais comentada e premiada do ano.
Demon Slayer (Kimetsu no Yaiba) conta a história de Tanjiro Kamado, um jovem que vive numa família amorosa e pacata do Japão Imperial que é visitada e morta por um oni – um demônio que mata quase todos os membros, mas deixa viva sua irmã Nezuko – da imagem a cima – para ser transformada também num oni e assim matar Tanjiro e outros humanos sobreviventes da vila. A fim de exterminar Nezuko e salvar a vila, são visitados por um membro da Legião de Extermínio chamado Gyu Tomioka, que tem a personalidade fria, mas calculista e logo entende a situação – Nezuko, apesar de ter se transformado em um oni, resiste a tentação de matar humanos e protege seu irmão com sua vida. Gyu então a instala uma mordaça de bambu, para evitar que esta se alimente de carne humana, e confia a Tanjiro a missão de proteger sua irmã e se tornar um Demon Slayer como ele, graças a suas habilidades e sua força de vontade, recomendando-o a seu mestre Sakonji Urodaki que o treina e lhe ensina a Respiração da Água.
O anime é realmente tão bonito quanto dizem, talvez até mais. É o mais bonito que já vi em séries de animação, lembrando muito a produção daqueles longas como o Heróis Modestos do Studio Ponoc, mas nesse caso aqui, o trabalho é do estúdio Ufotable, que superou a incrível qualidade da Wit Studios que produz O Ataque dos Titãs e o estreante Vinland Saga. A beleza não só está nas manifestações de poderes que muito homenageiam a clássica arte do teatro japonês feita em papel-arroz – como mostro na imagem a cima, mas o próprio cenário em si, realizado numa computação gráfica tão realista que alguns ambientes, como rios, parecem que foram realmente filmados. Ressalto também o covil do vilão que foi claramente inspirado na escadaria de Escher, como mostro na imagem a seguir:
Apesar da qualidade de enredo e animação, o anime melhora muito mais da metade pro final, especialmente depois que são introduzidos Zenitsu e Inosuke. O começo demora pra conquistar de jeito, é necessário ter paciência. Eu mesmo quase larguei, mas teria me arrependido, pois depois apreciei até demais e vou explicar os motivos. Me incomoda bastante a necessidade de mostrar o flashback da vida humana de todos – literalmente todos! – os onis quando são mortos. Isso se torna cansativo na narrativa e não tem relevância. É compreensível que a tentativa aqui foi criar uma compaixão, mas o timing não foi bem inclusivo, logo que o elo que o espectador cria com o monstro, que um dia fora humano e teve uma vida triste, só é apresentado após assassinado e não antes, ou seja, não dá tempo de criarmos uma relação com a criatura para sentirmos a pena dela quando morta, tornando-se assim apenas um peso na narrativa que não a constrói para seu futuro a não ser em casos como a de Rui, que é um dos Seis Inferiores de Kibutsuji, e sua família, que tem sim uma trama carregada de emoções e com importância para o futuro da série. Já sobre os outros onis, é exaustivo e um recurso que torna-se um atraso, o que espero que não seja tão repetitivo nas próximas temporadas.
Mas a temporada se supera com muito mais pontos altos do que baixos, o que deixa o anime tão incrível quanto vende-se e com potencial enorme para sua continuidade. Os treinamentos de Tanjiro, tanto no começo quanto no fim da temporada, são momentos deliciosos e que superam o desânimo gerado com o ritmo devagar de suas missões solo, mas que, infelizmente, são necessárias para a construção do herói – o que faz a temporada ser muito melhor assistida depois que já completamente lançada, como neste novo costume de lançamento via plataformas de streaming que lança a temporada toda de uma vez, pois, caso seja assistido esporadicamente, acompanhando o lançamento semanal, corre o risco muito grande de dropar no meio da temporada antes de alcançar a melhor parte da trama – erro que, como eu disse antes, felizmente eu não cometi e alerto para que também não cometam.
O anime, apesar de ser um shounen de ação, se torna muito mais interessante em episódios que não são necessariamente de ação, mas os que constroem as relações dos personagens apresentados como o desenvolvimento do amor fraternal e dedicação de Tanjiro em curar sua irmã Nezuko e a brotheragem criada quando formado o trio de Tanjiro com Zenitsu e Inosuke cujos são tão interessantes, cada um a sua forma. Outros momentos mais políticos como o julgamento no Quartel-General da Legião no final da temporada tem um clima de tensão muito maior do que o protagonista ou o trio enfrentando qualquer vilão. Fica aí mais um ponto em que o estúdio Ufotable precisa melhorar para as próximas temporadas, talvez, emprestar-se um pouco de técnicas como da Toei Animation, responsável por Dragon Ball e One Piece, que tem qualidade muito maior na ação do que narrativa, o que faz o público prender-se até hoje com seus animes mesmo sem depender-se tanto de uma boa história, mas claro, sem que isto faça pecar a brilhante trama criada por Koyoharu Gotōge que já está escrita antes de ser adaptada, assim, uma vez não pode mais ser alterada, apenas aprimorada com a animação que já surpreende em sua beleza, mas ainda peca em ação – o que não é necessariamente um problema, logo que o sucesso Naruto não era também tão eficiente em lutas em sua primeira temporada, necessitando de contratar outro estúdio de animação para criar suas melhores batalhas após as críticas sobre ser um shounen muito mais dramático do que ativo, o que funcionou em épocas que a juventude tinha muito mais tempo para acompanhar animes, mas hoje vive na geração relâmpago de animes com ação desenfreada como One Punch Man, Boku no Hero Academia e o concorrente Fire Force, que também estreou este ano, mas perde muito em qualidade de enredo.
A ação de Demon Slayer funciona em momentos-chave, como mostro na imagem acima. Assim, a série se posiciona no pódio de melhor anime lançado neste ano, com sua trama rica e envolvente, sua qualidade de animação e a trilha sonora que nos ambienta muito no Japão Imperial dos anos 20, realizando assim uma combinação que supera todos os seus fortes concorrentes. Fico na ansiedade já pela segunda temporada, pois a primeira deixa em aberto vários mistérios que o espectador vai muito querer desvendar e inclusive trabalhar teorias – as quais já estamos trabalhando e muito provavelmente vamos lançar artigos e artigos sobre tais.